“Meu amor, essa é a última oração pra salvar seu coração…”. Eu acordei na quarta-feira, 30, com os versos da música “oração” na cabeça. Era o início do momento pelo qual esperei por 2.423 dias: o julgamento dos assassinos de minha esposa, Marielle Franco, e de Anderson Gomes.
Não foi só a saudade ou a indignação pela perda da minha esposa que me fizeram levantar da cama naquele dia — ainda que a trilha sonora fosse melosa. A expectativa por respostas não era só minha, era coletiva. A sociedade brasileira e o mundo exigiam justiça para o crime de maior repercussão da história recente do nosso país. Um crime que abalou a democracia e escancarou a podridão da política do Brasil.
Ronnie Lessa e Élcio Queiroz não estavam desacompanhados. Por trás deles, segundo a delação de Lessa, figuravam dois nomes poderosos no Rio de Janeiro: os irmãos Brazão. Os dois teriam encomendado o assassinato de Marielle por questões fundiárias, para que ela não atrapalhasse os negócios lucrativos e ilegais de grilagem de terras da família. Não há um preço justo a ser pago pelo que fizeram, não há medida de reparação possível. Mas se são esses os mandantes, e esses motivos, então que também sejam condenados e paguem um preço ainda maior do que o dos assassinos executores.
Ronnie Lessa e Élcio Queiroz não estavam desacompanhados. Por trás deles, segundo a delação de Lessa, figuravam dois nomes poderosos no Rio de Janeiro: os irmãos Brazão. Os dois teriam encomendado o assassinato de Marielle por questões fundiárias, para que ela não atrapalhasse os negócios lucrativos e ilegais de grilagem de terras da família. Não há um preço justo a ser pago pelo que fizeram, não há medida de reparação possível. Mas se são esses os mandantes, e esses motivos, então que também sejam condenados e paguem um preço ainda maior do que o dos assassinos executores.
E Lessa topou porque a morte de Marielle valia muito dinheiro. Ele priorizou o assassinato dela, em detrimento de outro, porque receberia uma fortuna, R$ 25 milhões. E é esse o perfil desses mercenários: eles precificam a vida. Definem, com base na recompensa, quem vive e quem morre. Élcio não é diferente. Ele queria seguir os passos de seu comparsa, enriquecer às custas da morte.
A perda de liberdade de Lessa e Queiroz, sentenciados a 78 e 59 anos de prisão, respectivamente, precisa ser só o começo. Quem não valoriza a vida do outro não deveria ter a sua própria considerada. O perdão hipócrita, que Lessa, desesperado por uma redução de pena, pediu a nós familiares, jamais virá. Assim como espero que para ele não haja nenhuma redenção.
É inegável: foi um passo importante na luta por justiça e no resgate da democracia desse país. Mas ainda não é suficiente, se os acordos não forem cumpridos, se os réus ganharem a liberdade em breve, se os mandantes não forem condenados, a impunidade ainda vai soar como uma possibilidade. E outras Marielles e Andersons terão suas vidas arrancadas brutalmente.
Ao ler a sentença, a juíza Lúcia Glioche, do 4º Tribunal do Júri, passou um recado político importante: a Justiça alcança mesmo quem se julga inatingível. Em sua fala, ela afirma que a condenação dos assassinos serve para que crimes assim não sejam repetidos. Para que nunca mais eleitores tenham seu direito de representação ceifado, ou famílias sejam destruídas. E, ao usar o caso como exemplo, há também um compromisso com o próprio legado de Marielle.
Naquela noite, não teve trilha sonora melhor do que as palavras da juíza, ao dirigir a sentença “aos vários Ronnies e vários Élcios que existem na cidade do Rio de Janeiro”. E por isso fecho esse texto esperançosa, com a transcrição da fala dela: “fica aqui para os acusados presentes e serve para os vários Ronnies e vários Élcios que existem por aí, soltos, a seguinte mensagem: a Justiça por vezes é lenta, é cega, é burra, é injusta, é errada, é torta, mas ela chega”.
Marielle e Anderson, PRESENTES!
* Monica Benicio é viúva de Marielle Franco e vereadora